Por Andrey Romaniuk
Esta semana recebi em casa um exemplar do livro Beyond Risk: Conversations with climbers, de Nicholas O’Connell, em inglês, que comprei pela internet. O livro é de 1993, e trata-se de uma compilação de entrevistas com alguns dos mais importantes personagens montanhísticos do cenário mundial. Cada capítulo dedica-se a uma pessoa, falando um pouco sobre seus feitos e mostrando um pouco de suas impressões sobre esta atividade que tanto os fascina. De Reinhold Messner a Lynn Hill. De Wolfgang Gullich a Walter Bonatti.
Enfim… o autor busca uma tentativa de extrair indiretamente dos entrevistados a resposta para aquela velha e talvez irrespondível pergunta montanheira: “Por que escalar?”. Assim, deixo aqui traduzido um trecho da introdução do livro, na qual o autor descreve de uma maneira muito bela “uma das” respostas a esta fascinante pergunta, que me identifiquei bastante e recomendo o livro a todos amigos da Montanha.
“Enquanto escrevia este livro eu fui algumas vezes questionado se os escaladores realmente tem um desejo de morte. A suposição me pareceu que qualquer pessoa que realize objetivos tão perigosos e improváveis deve ser mentalmente desequilibrado de alguma maneira, que consciente ou insconscientemente as escaladas devem ser missões suicidas, uma espécie de roleta Russa, onde perder significa a morte e vencer significa – o que isso significa?
Depois de entrevistar alguns dos maiores escaladores do mundo e pensar sobre o significado da atividade que escolheram, eu posso honestamente dizer que nada poderia estar mais longe da verdade. O que anima os escaladores não é um desejo de morte, mas um desejo de vida, um desejo de viver – plenamente, completamente, intensamente. Eu nunca conheci um grupo de pessoas mais verdadeiramente vivos – fisicamente, emocionalmente, intelectualmente, espiritualmente. Ao contrário de procurar o perigo para seu próprio bem, eles o fazem como sentido de aprofundar-se e enriquecer suas experiências de vida.
Como grupo, então, eles deveriam ser vistos não tanto como caçadores de emoção, mas como caçadores da verdade. Eles escalam não somente pela adrenalina ou exercício, mas pelas oportunidades de ganhar introspecção dentro de si e no mundo que os rodeia. Vias longas, exaustivas e nervosas servem como purgatórios através do qual eles devem passar para testar e aperfeiçoar seu caráter.
Para a escalada, trata-se mais do que completar uma via difícil; trata-se também sobre a completude de si próprio. Ao contrário de ser outro esporte ou passa tempo, isto pode ser visto como um caminho para o auto-conhecimento, um sentido de crescimento e renovação em contato com a natureza, um meio de experimentar em um tempo curto e concentrado os extremos da emoção humana, a extraordinária alegria em estar completamente vivo, e o medo nu em enfrentar grande risco, provendo desta forma um vislumbre para dentro da natureza essencial da vida humana.
Pela escalada conter essa notável concentração de experiência humana, pode ser vista como um microcosmo para o resto da vida. Que requer coragem na adversidade, graça sob pressão, e generosidade e paciência em situações exasperadoras – todas as qualidades necessárias para ter sucesso e permanecer razoavelmente são na vida diária. Devido a escalada representar o drama humano em todos seus milhares de aspectos, torna-se uma metáfora apropriada para outros aspectos da vida.
Talvez é esta dimensão metafórica do montanhismo que explica sua atração não só aos escaladores, mas também ao público em geral…”
Nicholas O’Connell (Beyond Risk: Conversations with climbers)
Após isso tudo, ainda me vem a lembrança da simples e riquíssima resposta do Sr. George Mallory quando questionado “Por que escalar Montanhas?”
“Se você realmente precisa fazer esta pergunta, então, meu caro, não há resposta que irá fazê-lo compreender.”
nossa, show essa explicação do porque, acho que a melhor que eu já li, a que mais se aproxima do que realmente pensa e sente um escalador
Renato
Muito obrigado por partilhar essas belas palavras…
E parabéns pela aquisição!!
Stay Trad!
Muito interessante o trecho escolhido, demonstra que o livro levanta várias respostas , para esta pergunta que cada um leva consigo (talvez por isso que é impossível ter apenas uma resposta que possa fazer compreender o outro, segundo Mesnner), bacana também é a formulação da questão com um outro ponto de vista: qual é o significado da vitoria para a escalada? Sendo que a derrota sempre é vista como algo pessimista, que caracteriza o escalador como louco suicida. O próprio texto já dá uma resposta significativa que é o próprio desejo de vida, sendo enriquecida por cada vitoria. Mas percebo que a questão da vitoria para o escalador também merece outra atenção: quando saímos vitoriosos de uma empreitada, seja uma cadena, montanha ou uma trilha, não nos prendemos a ela, porque sempre buscamos mais; e percebi isto quando li uma frase de Kafka que diz que o verdadeiro vitorioso não se reconhece através de suas vitorias, simplesmente para não se transformar escravo de seu próprio passado, talvez seja por isto que o escalador vive sempre buscando o desejo de viver cada vez mais.